Paramount Pictures lança também os cartazes dos personagens do filme, que estreia nos cinemas brasileiros em 13 de abril
O aguardado filme “Dungeons & Dragons: Honra entre Rebeldes” ganhou um novo teaser eletrizante que será exibido no próximo domingo, 12 de fevereiro, no intervalo do Super Bowl, tradicional final do campeonato de futebol americano.
Além do novo vídeo, a Paramount Pictures revelou também os cartazes dos personagens principais do longa, interpretados por Chris Pine, Hugh Grant, Michelle Rodriguez, Regé-Jean Page, Justice Smith e Sophia Lillis.
Baseado no jogo de RPG, “Dungeons & Dragons: Honra Entre Rebeldes” chega aos cinemas nacionais em 13 de abril. A produção conta a jornada de um ladrão encantador e um bando improvável de aventureiros que armam um plano épico para recuperar uma relíquia perdida. Mas as coisas vão perigosamente mal quando eles encontram as pessoas erradas. O longatraz o mundo rico e o espírito divertido do lendário jogo de RPG para a tela grande em uma aventura hilária e repleta de ação.
O filme é uma associação entre a Paramount Pictures com a eOne e tem direção de Jonathan Goldstein e John Francis Daley, roteiristas de “Homem Aranha: De Volta ao Lar”. A produção executiva é assinada por Jeremy Latcham, conhecido por seu trabalho nos filmes “Os Vingadores”, “Homem de Ferro” e “Guardiões da Galáxia”.
Longa estreia em 13 de abril nos cinemas brasileiros
A Paramount Pictures divulgou o novo trailer do esperado “Dungeons & Dragons: Honra Entre Rebeldes”. A adaptação do jogo de RPG conta com grandes nomes no elenco, entre eles, Chris Pine, Hugh Grant, Regé-Jean Page e Justice Smith. Michelle Rodriguez, Sophia Lillis, Chloe Coleman e Daisy Head completam o time estrelado do longa.
A história narra a jornada de um ladrão encantador e um bando improvável de aventureiros que armam um plano épico para recuperar uma relíquia perdida. Mas as coisas vão perigosamente mal quando eles encontram as pessoas erradas. O longatraz o mundo rico e o espírito divertido de Dungeons & Dragons para a tela grande em uma aventura hilária e repleta de ação.
O filme é uma associação entre a Paramount Pictures com a eOne e tem direção de Jonathan Goldstein e John Francis Daley, roteiristas de “Homem Aranha: De Volta ao Lar”. A produção executiva é assinada por Jeremy Latcham, conhecido por seu trabalho nos filmes “Os Vingadores”, “Homem de Ferro” e “Guardiões da Galáxia”. “Dungeons & Dragons: Honra Entre Rebeldes” chega aos cinemas nacionais em 13 de abril.
Confira minha resenha COM SPOILERS do filme Doutor Sono
Começamos falando de O Iluminado, o livro e o filme, que todos conhecem e não provocaram insônia em ninguém.
De todas as maneiras de estabelecer um debate, coube a Stephen King e ao diretor Mike Flanagan o crédito pela criação da fórmula mais recente. Infelizmente, para King, a iniciativa não ajudou os seus argumentos: criar uma continuação para um filme.
No caso não é um filme qualquer. A novela O Iluminado de King foi adaptada em 1980 por Stanley Kubrick. Estrelada por Jack Nicholson, foi aos poucos sendo reconhecida como uma das grandes obras de terror já feitas. Ao final dos anos 80’s, King passou a criticar a adaptação, motivado pelo fato de que, naquela época, as adaptações de seus livros começaram a se tornar muito lucrativas e encontraram espaço para o reconhecimento crítico e na festa do Oscar.
Segundo King, Kubrick havia modificado a sua obra, alterando o personagem Jack Torrance, que deveria ser um homem comum, essencialmente bom, que lutava para reter a sanidade e os laços familiares, sendo assombrado pelas forças malignas que encontrou no Hotel. Segundo ele, a atuação de Nicholson e a visão de Kubrick davam a entender que Jack já estava louco quando o filme começava e nada havia a perder (a despeito do fato de que Jack já enfrentava problemas com alcoolismo e era culpado de violência doméstica, no começo do livro).
King tentou forçar a mão no debate com uma adaptação para a televisão da obra. Mas, feita nos inícios dos anos 90, a série é esquecível. Sem orçamento para a produção, parece pertencer aos 70’s de tão simplista, especialmente considerando que foi realizada depois de Twin Peaks, Arquivos X ou Plantão Médico. Comparado com o filme de Kubrick, não existe força para justificar qualquer comparação, pois o orçamento e a ambição da série não permitem que as duas obras sejam colocadas em pé de igualdade.
O tempo não ajudava S.K. (Stephen King, não Stanley Kubrick), já a reputação de Kubrick e o seu O Iluminado apenas se solidificava. Porém, King, o escritor, tinha uma nova ambição. Na sua cabeça, os muitos “easter eggs” que ligavam as suas obras serviram de base para um “Kingverse”, em que seus antigos personagens eram reciclados. Assim, em 2013, publicou Doutor Sono, continuando a história de Danny Torrance, o filho de Jack, que sobreviveu ao Hotel e tem outros problemas para enfrentar. É claro que o livro de King é uma continuação ao romance de King e pouco ajuda neste debate. Até que uma adaptação de Doutor Sono foi realizada por Mike Flanagan com Ewan McGregor no papel principal.
Mike deixou claro que seu objetivo não era fugir de Kubrick, mas de criar um filme que funcionasse como um elo entre os dois SKs. Assim, ele modificou parte da história – contando com o apoio de King – e buscou referências visuais na obra de Kubrick.
O resultado é o filme Doutor Sono, que de uma só vez dá razão ao “time Kubrick”. Como?
Primeiro cabe aqui um julgamento moral. Como todo autor, King tem o direito de fazer o que quiser com a sua obra. Não é o primeiro autor a ter esses não-me-toques. Cervantes, o grande Cervantes, reagiu de maneira similar ao tomar conhecimento de uma segunda parte do Dom Quixote que gozava de algum sucesso. A obra havia sido feita por rivais de Cervantes (provavelmente) e satirizava o autor e seus personagens. Foi essa a motivação para o autor espanhol escrever a segunda parte do Quixote. E o resultado não poderia ser melhor: apesar de ser menos cômica, a segunda parte fecha a história do personagem com perfeição, transformando o livro de uma paródia às novelas de cavalarias a uma obra sobre a psicologia de dois personagens únicos da literatura, de tal forma que é quase impossível pensar no Dom Quixote sem pensar no conjunto das duas partes e relegando de vez a sequência apócrifa em uma mera curiosidade literária.
Há, entretanto, uma diferença. O filme O Iluminado já não é uma obra de Stephen King. É uma obra de Stanley Kubrick. Não há pecado em modificar uma obra. Na verdade, é o motor de toda arte. Como diria Jorge Luís Borges: o original é infiel à cópia. Cabe aqui pensar no que se trata cada obra e se a versão de Kubrick merece a crítica de King.
Stephen King é um bom escritor de terror. Tem problemas sérios para desenvolver novelas e fechar seus longos textos, mas usa bem a referência do terror anglo-saxão, não apenas literária, mas de quadrinhos e cinema, para dar cor às suas obras. Na maioria das vezes, é um escritor juvenil. Seus “terrores” são valentões de escola e monstros retirados de filmes velhos. Funciona melhor em histórias curtas. São terrores muito visuais, o que faria da classificação como gótico moderno acertada. Além disso, incluí vários personagens escritores, em geral enfrentando problemas por algo que escrevem ou deixam de escrever. É o medo da própria imaginação (ou a possível falta de).
O Iluminado talvez seja seu melhor romance. Há uma tensão crescente na obra, mas passa longe de ter grandes personagens e por isso funciona enquanto acompanha Dan. Faz sentido que uma criança sinta muito medo não por imagens de morte (ou mortos), mas da imagem do pai. Além disso, existe um certo exorcismo na obra: o terror causado pelo alcoolismo é importante para King, mas é algo pessoal.
No caso de Kubrick, por mais difícil que seja definir suas obras, há um constante terror causado pela natureza humana. A violência e o potencial de destruição da humanidade são seus temas e são expostos por uma fachada de civilidade ou de progresso. A violência de Alex em Laranja Mecânica, apesar de seu gosto por Beethoven e da psiquiatria. A bomba atômica do Doutor Fantástico. Os duelos em Barry Lyndon. A sociedade secreta em De olhos bem fechados. A guerra em Nascido para Matar e em Glória Feita de Sangue.
O melhor exemplo é naquele filme de terror que é 2001. Quando o monolito provoca a evolução dos entre os primatas, qual é a cena que se segue? Matança e a descoberta do uso da ferramenta como arma. Quando o monolito age sobre HAL 9000, o que acontece? Ele se torna um serial-killer, sem qualquer remorso. Em O Iluminado, o tema não é o alcoolismo de Jack, algo pessoal para King. É a violência que ele pode produzir, inerente, já que herdou dos nossos ancestrais primatas. A terrível simetria do hotel, digna de poemas de William Blake, é uma representação do labirinto que é a história humana e a unidade familiar, assim como as sociedades, se desfazem porque Jack é naturalmente violento, como todos os homens.
Sim, isso quer dizer que Jack já seria louco desde o começo, como argumenta King. Mas, em todas as suas histórias, Kubrick usa elementos para acionar a violência. Não são animais descontrolados. Existem “Monolitos Negros” em todos os filmes e em O Iluminado é o Hotel. A obra de King é sobre uma casa mal-assombrada e o medo causado pelo alcoolismo. No filme, a casa mal-assombrada está presente, mas é um álbum de fotografias para o verdadeiro terror: a natureza humana. É uma obra muito mais madura em sua temática, mas ambiciosa. A reação de King chega a parecer uma certa inveja profissional. Kubrick foi mais longe, ou ao menos tentou.
Claro, que a intenção é apenas uma mola para a execução do projeto e Doutor Sono é uma evidência da execução superior de Kubrick.
DOUTOR SONO (Acorde que vem SPOILERS)
No filme, Dan é um adulto, às voltas com o alcoolismo e seus fantasmas. Com ajuda de Dick Hallorann (ou o fantasma de Dick Hallorann), descobre uma maneira de manter os fantasmas do Hotel aprisionados, pois agora, eles são seres que se “alimentam” do seu brilho. Com isso, descobrimos que existe um grupo de pessoas, chamado de True Knots, que se alimentam e caçam pessoas (crianças principalmente) para se alimentarem do tal brilho, cujo sabor é “ampliado” pelo medo e pela dor.
Esse grupo é descoberto por uma menina especialmente poderosa, Abra, que entra em contato com Dan. Como está cada vez mais difícil encontrar brilho em quantidade suficiente (por causa do uso excessivo da internet ou dos celulares, as pessoas têm menos imaginação, portanto menos medos), ela se torna o próximo prato no menu dos caçadores de “iluminados”. Até aí, o filme é um tipo de filme de super-heróis. Os vilões se identificam por codinomes, se vestem de maneira peculiar e cada um deles tem um tipo de poder específico.
Flanagan é fã de Kubrick e constantemente reutiliza tomadas e falas de O Iluminado. Chega a recriar cenas com Danny e mãe, usando um diálogo idêntico a um momento em que Danny sumira no filme, inclusive com a voz esganiçada de Shelley Duvall. Repete inclusive as longas cenas acompanhando carros passando por estradas sinuosas, filmadas de longe.
King comparou o filme de Kubrick com o belo Cadillac, sem motor. Sem alma. É aqui o primeiro erro. Inseridas em Doutor Sono, essas cenas são como atrações de um parque de diversão, que você sabe que apenas se parecem com os personagens originais da Disney. São fantasmas assombrando Mike Flanagan e não a audiência. Elas não estão ali para algo além de nos fazer lembrar do terror que um dia causaram.
A história é derivativa de outras histórias do próprio King, que constantemente enche seus “vilões” de capangas, os coloca em acampamentos baratos e outras áreas periféricas. Mas eles pouco importam. Nenhum deles tem personalidade ou importância, exceto a líder, Rose the Hat. Mesmo o segundo membro mais destacado deste grupo, Crow Daddy é reduzido a um estereótipo: como nativo-americano, ele é um caçador capaz de encontrar as presas que o grupo precisa. E o filme perde tempo mostrando a iniciação de Snakebite, que não tem importância nenhuma para a história.
Também é derivativo de um RPG: Changeling: the Dreaming. Nele, fadas se alimentam do “glamour”, uma energia derivada da imaginação, que está em falta no mundo moderno. Algumas fadas conseguem se alimentar da energia gerada de emoções positivas como esperança e alegria, enquanto outras se alimentam da energia gerada por emoções negativas como medo e dor. E como um RPG, o filme se desenvolve: após um duelo inicial entre as forças de Dan e Abra contra o grupo de Rose, nos movemos para o palco do duelo final. É claro, o duelo é no Hotel Overlook.
Para levar os personagens até o hotel, o filme decide que Dan precisa agir e falar de maneira incoerente. Ele impede o pai de Abra de pedir ajuda policial para proteger a filha, afirmando que os True Knots são pessoas poderosas com ligações com figuras influentes. Mas o grupo vive em acampamentos itinerantes, completamente marginalizados, sem qualquer indicação de terem laços com humanos normais. Ele nem ao menos conhece um único membro do grupo e nada que Abra lhe contou parece sugerir tal coisa.
Depois, ele diz que os dois não poderiam enfrentar Rose, por isso precisavam de algo poderoso e pior do que Rose (os espíritos do hotel). Mais uma incoerência: Abra surrou Rose em todos os encontros que tiveram. De fato, o que foi estabelecido em uma cena anterior e que é a única razão para Rose ainda estar viva, é que ela é incapaz de enfrentar Abra. Mas precisamos do Hotel, senão o fantasma de Kubrick não pode ser exorcizado.
A partir daí, temos apenas uma tentativa de recriar as imagens de Kubrick e dar ao filme o final que o cineasta se recusou a dar: explodir o hotel. Flanagan é um Édipo, tentando furar seus olhos pelo pecado de admirar Kubrick. Somos brindados com repetecos de cada cena famosa do filme, como o elevador com o rio de sangue ou as gêmeas e nenhuma delas tem qualquer importância. Abra é, como estabelecido, mais poderosa do que Dan, Rose e o hotel, e sem muito esforço se livra de um Ewan McGregor fazendo cosplay de Jack Nicholson. Apenas falta ir para Massachussets e entrar para os X-Men.
King, ao final do filme, se sentiu cheio de orgulho em dizer que “agora” o que havia criticado no filme de Kubrick parecia bom e justificado. É algo freudiano, pois, tirando a atuação competente do elenco principal, Doutor Sono é um filme sem alma, que separou de vez um artista que será lembrado como um dos maiores da sua arte e um escritor apenas eficiente.
Quando Rogue One foi lançado, passei a afirmar que a trilogia original havia sido modificada e agora era feita de Rogue One – Guerra nas Estrelas – O Império Contra-Ataca, nos livrando da infantilização que Lucas imprimiu à série a partir de O Retorno do Jedi, simbolizada pelos Ewoks.
Não é que ser infantil é algo inerentemente ruim (Alice e Emília continuam sendo duas das mais interessantes personagens já criadas), mas o caminho que Lucas passou a seguir nos levou a um mundo cheio de preocupações com a segurança dessas crianças. Chega de riscos. Tudo precisa ser explicado e banalizado. As perguntas precisam de respostas, mesmo que não precisassem ter sido feitas.
Claro, Alice e Emília são evidências de que crianças se viram sem precisarem dessas proteções todas. Mas enfim, quando a Disney assumiu a produção do Star Wars, ela voltou a buscar um público mais maduro, em grande parte formado pelas versões digitalizadas dos três primeiros filmes e pelas prequels. Ou seja, um público que se sente confortável demais e preza o conforto como um direito adquirido. Sem entrar na questão da execução da trilogia final, podemos ver como passou existir uma preocupação em criar respostas para essas perguntas que nunca precisaram ser feitas.
Veja o caso de Solo. Você não consegue produzir um bom filme, independente de atores, diretores, efeitos especiais etc, se a motivação para criação deste filme não existe. Qual era a história que precisava ser contada em Solo? Como os produtores não sabiam, o filme se preocupou em existir para responder perguntas tão relevantes quanto a forma como Lando perdeu a Falcon para Han. Apesar de ser um Universo enorme, cheio de potenciais, as perguntas, é claro, estão sempre relacionadas aos heróis originais. Anakin, Leia, Luke, Han e aquele planeta isolado que é o centro do Universo: Tatooine.
As séries de streaming demonstram isso bem: Mandalorian funciona não apenas por recuperar o tipo de narrativa essencial para Guerra nas Estrelas (as séries de ficção científica Pulp como Flash Gordon e Buck Rogers). Mas, apesar de apresentar laços com o que aconteceu na série clássica, não é dependente dela. Baby Yoda e Mando apenas nos fazem pensar em Yoda e Boba Fett, mas têm independência. Suas questões e conflitos não resolvem as questões e conflitos que outros personagens apresentaram. Assim, quando a série faz um retorno ao “núcleo clássico”, é algo casual, pouco forçado, que não arrebenta a trama da série. Em termos narrativos, a coincidência (enorme, pois são galáxias) não é forçada como o romance de Anakin e Padmé.
Mas compare com as séries Boba Fett e Obi-wan. Essas duas séries não conseguem se afastar do núcleo clássico. Estão preocupadas em contar como o povo da areia faz suas armas, como Boba escapou do Sarlacc, como foi preenchido o vazio político deixado pela morte de Jaba, porque Obi-wan disse que Vader matou Anakin, e assim vai. Não existem histórias que precisam ser contadas.
Andor era uma dúvida. Havia uma história a ser contada? Rogue One funciona bem pois a pergunta: “Como os planos da Estrela da Morte foram roubados?”, que motivou o sinal verde para a produção do filme foi respondida, mas Tony Gilroy, responsável pela reescrita do roteiro e tomadas extras, entendeu que esses planos não eram importantes. O importante era que os personagens Andor e Jyn tinham uma história a ser contada e essa história tem a sua própria força. E que ainda assim realçam a importância de Luke, Leia e Solo, pois eles lutaram não pelo seu próprio heroísmo individual, mas por vários heróis sem importância que se sacrificaram por aquela causa, sem nem acreditarem em Jedis. Se essa história estava contada, o que a série nos ofereceria?
Andor, a série, caminha por uma trilha cheia de armadilhas. Seria fácil contar a história apenas de como Andor vai do ponto A ao B: de um personagem cínico e pouco interessado na política intergaláctica a um mártir da rebelião. Essa história foi contada, mas é apenas um fio da narrativa que deixa de lado perguntas sem importância e muda de vez a piada que conto no começo desta resenha: agora temos Andor e o resto.
Em um nível básico, Andor é o romance de formação de Andor, o personagem, no sentido dos romances de formação clássicos. Um jovem sem uma motivação definida acaba enfrentando uma série de acontecimentos casuais que o obrigam a sair de casa e passar pelo amadurecimento final. É o destino que faz com que se envolva em um crime, passe a ser investigado por um burocrata zeloso a serviço do Império (Karn), acabe atraindo a atenção de um líder rebelde (Luthen), que o leva a ajudar a rebelião, termine preso e assim vai. Quando chegamos ao final e sabemos como Andor zanzou de A para B, nem importa mais: o personagem passou por tantas transformações (não por acaso, o romance arquétipo deste tipo de narrativa conta a história de um jovem que passa por várias aventuras após ser metamorfoseado em um asno: O Asno de Ouro de Apuleio) que o ponto final se torna uma questão de formalidade gramatical. Cada vírgula de suas aventuras é um ponto para as aventuras que formaram a Rebelião e o próprio Império.
Pois sim, se as grandes histórias são protagonizadas por heróis como Leia e Luke, as rebeliões são feitas por homens que hesitam diante do heroico e por isso pagam preços mais radicais. O herói sacrifica a si e ao ethos que simboliza. O não-herói perde a própria vida, a sociedade, a família. O seu sacrifício destrói o que tem de mais valioso ao redor. Assim, a história de Andor enobrece a saga de Luke e Leia. Esta é a rebelião pela qual eles lutaram e pela qual jamais aceitaram deixar-se corromper (ficar velho e ranzinza é apenas a passagem do tempo, coisa que nenhum herói consegue impedir).
Mas a série se esmera em apresentar outros protagonistas. A história da formação da Rebelião é engrandecida pelo personagem Luthen, um jogador de xadrez que coloca em ação os eventos que levarão tanto o Império quanto a Rebelião aos extremos necessários para o seu duelo final. Com Luthen, descobrimos que o destino do universo não foi decidido em um duelo de sabres, mas por meio de engrenagens sociais complexas, causas e consequências, que levam Guerra nas Estrelas ao nível das melhores distopias já criadas.
Isso não é uma traição à Guerra nas Estrelas de Lucas, que sempre usou modelos reais (como a queda da República Romana ou o Nazismo) para representar o Império. Agora, a crueldade (muitas vezes gratuita) do Nazismo, a sua sanha pela burocracia, ganha dois rostos, que parecem ter sido retirados dos textos dos autores da Escola de Frankfurt como Hannah Arendt: Karn e Dedra. O Império se torna ainda mais terrível por ser realisticamente ineficiente. A necessidade de controle e de punição é uma marca da fraqueza destes regimes.
Karn é um personagem pequeno burguês, de ambições grandes demais para a sua mediocridade. Esse pequeno burocrata é eficiente, mas é essencialmente medíocre. Parar as engrenagens que formaram a Rebelião é muito além do que daria conta, mas nada disso o impede de tentar e com isso entra em contato com Dedra.
Ela pertence à linhagem do oficial da SS que Peter Cushing representou no primeiro filme. Eficiente, dura, racional (certamente deve considerar os Jedis e Siths uma velha religião) e frustrada diante da ineficiência da organização do Império. Se Karn é um tolo que acredita no bem resultante da ordem, Dedra não tem tal ilusão. Mas mesmo ela, com todo seu poder, está aterrorizada pela invasão que Karn promove ao segui-la. Com menos discursos ideológicos, Andor expõe a experiência feminina com mais eloquência do que todas as produções da Marvel.
Mais do que simplificar, mostrando a criação dos sistemas de controle imperiais, a série expõe as engrenagens do universo. Luthen catalisa as ações do Império que, por sua vez, é responsável pelo amadurecimento de Andor. A coincidência é cármica. É a Força que liga todos os seres vivos do universo, mesmo que não tenham sobrenome Skywalker.
Mas Luthen não é um simples anti-herói ou uma leitura barata de Nietzsche. Em uma cena memorável do 10º episódio, ele está sobre um abismo, pronto para fazer um discurso para um espião que decide deixar a causa. Ele não precisa dizer a única frase que todo mundo conhece sobre Nietzsche, pois transcende a leitura barata utilitarista do existencialismo. Luthen procura heróis, não ditadores. Ele quer provocar heróis para agirem, pois até mesmo eles estão agrilhoados pelas coincidências do universo, do destino, da novela. É um diálogo memorável, do nível do monólogo de Rutger Hauer em Blade Runner.
Esse é o grande episódio da série. Quem se lembra da estética geométrica de Guerra nas Estrelas, que a série recaptura, encontra um triângulo perfeito. Um terço do episódio mostra uma cena composta com capricho kubrickiano: Mon Mothma, a outra personagem central da série, precisa de dinheiro para a rebelião e negocia uma forma de lavar dinheiro com um gangster. Sim, em Guerra nas Estrelas (a série também introduziu um bordel para os inocentes fãs).
Apesar de aparecer menos que Andor e Luthen, Mon rouba todas as suas cenas. A sutileza de olhares, a explosão reprimida pelos lábios apertados, os gestos contidos, tudo que Genevieve O’Reilly traz em cena é notável. Durante toda a cena, o corpo aponta para o lado contrário do diálogo. Seu desconforto é enorme. Em seguida, Andor foge de uma prisão que tem a forma de uma porca de parafuso para descobrir que o seu principal aliado (Andy Serkis finalmente dando vida a um personagem e não a um holograma) não é capaz de nadar. E Luthen discursa na beira de um abismo. Todos os três eventos são sobre agir e não agir. A questão existencial básica. Aquela que Yorick não conseguia responder para o príncipe Hamlet.
Andor enriqueceu o universo Star Wars de tal forma que sua existência parece ter sido o verdadeiro objetivo do primeiro filme. Tornou-se fundamental, muito além da cronologia e do conceito de cânon. Porque não faz perguntas que não precisam existir e porque acredita na coincidência, essa força inevitável de toda novela, que une destinos por todo universo sem precisar de malabarismos narrativos e clones descartáveis.
Confira a crítica com spoilers do colaborador convidado João Camilo sobre a série
Esta história começa com a Amazon.
A empresa tem um histórico de apostar nas mudanças causadas pelas revoluções tecnológicas sem valorizar os elementos humanos. Basta dizer que, apesar de ter conseguido lucrar durante o período mais grave da pandemia, foram registrados vários protestos de seus trabalhadores pela falta de suporte e excesso de trabalho durante o período.
Os Anéis do Poder parece repetir essa mentalidade: apesar de ser a série de televisão mais cara da história, o dinheiro não foi investido na contratação de atores, roteiristas e diretores. Resultado: o roteiro é irregular, com diálogos e personagens simplificados e falta coesão entre as partes da obra. Sabemos para onde o dinheiro foi: visualmente a série é magnífica, reproduzindo cenários gigantescos e cuidado com os detalhes e a aparência dos personagens. Não é muito diferente dos filmes de Peter Jackson e há uma razão prática para que a série se aproxime mais das duas trilogias. Não apenas pelo fato de os filmes serem mais recentes (e da implicação óbvia: são mais conhecidos do que os livros), mas também pelo fato da Amazon não possuir direitos sobre toda a obra de Tolkien, e sim do material basicamente citado em O hobbit e O Senhor dos Anéis.
Tanto o filme quanto a série operam dentro da lógica de blockbuster hollywoodiana, que favorece os efeitos especiais e as cenas de ações. A palavra usada para descrever é “épico”, mas tem sido usada apenas no sentido de grandeza (já que as narrativas épicas eram, de maneira geral, longas) e não da grandiosidade (os feitos de seus heróis). É discutível se a narrativa do livro O Senhor dos Anéis é épica, mas é claro que nos filmes (especialmente O Senhor dos Anéis) existem mais elementos para serem explorados dentro desta premissa do que em Os Anéis do Poder. A criação do Um Anel não é uma história de aventuras e ação, mas de manipulação. É apenas depois da criação de Um Anel, com a formação de uma aliança entre Anões, Humanos e Elfos para enfrentar Sauron que isso muda.
A série se dividiu em quatro núcleos distintos inclusive no estilo: Galadriel e Halbrand; Elrond e Durin; Nori e Gandalf; Arondyn e Bronwyr. Apenas as duas primeiras são realmente sobre os anéis de poder. Arondyn e Bronwyr acabam sendo absorvidos pela primeira narrativa e Nori e Gandalf apenas se integram na narrativa geral como uma tentativa de gerar dúvidas sobre a verdadeira identidade de Sauron. Há uma aposta em criar um mistério e esse jogo de tentar ludibriar o espectador acabou provocando um esvaziamento da narrativa, que afetou os personagens Galadriel e Sauron.
É evidente, que a narrativa mais importante é a que envolve Galadriel e Halbrand e nela se concentram os maiores problemas da série, por isso podemos começar por onde esses problemas não são tão fortes. Ainda assim, é interessante notar que toda a série sofreu com a administração do tempo e espaço da narrativa, jogando o mundo de Tolkien (pelo qual eles pagaram pelos direitos autorais) pelo ralo. Oceanos têm tamanho de piscina, viagens são instantâneas e mesmo quando a série mostra que existem essas grandes distâncias (mostrando os mapas e nos diálogos dos personagens), não há uma consequência dessas distâncias.
Nori e Gandalf
A falta de consistência nos diálogos dos harfoots, um tipo de hobbit, é o maior problema desta parte, além da presença misteriosa e sem muito impacto dos seguidores de Sauron. De maneira geral, deveria ser claro que o estranho era Gandalf (ou no máximo Saruman) e a única dúvida seria levantada pelo constante uso de elementos de fogo. O estilo deste arco é mais infantil, mas isso não é um problema. O Hobbit é uma obra infantil assim como o começo do Senhor dos Anéis, justamente a parte que explora a relação de Gandalf com o Condado. Tolkien nunca escreveu sobre os primeiros encontros entre Gandalf e os hobbits, portanto havia espaço para ser explorado.
Arondyn e Bronwyr
Se Tolkien não havia escrito sobre os primeiros dias de Gandalf e os harfoots, menos ainda escreveu sobre o que os orcs faziam quando não estavam em guerra e sobre os homens do sul. Havia muito potencial e todos os personagens apresentados nesse arco foram criados pela série. Essa parte da narrativa começa bem, (apesar do lugar comum do romance entre Arondyn e Bronwyr e as cenas de combate mais propícias para um filme de Jack Chan), mas logo perde vigor, na medida em que Adar, o líder dos Orcs, passa a ser usado apenas para alimentar dúvidas sobre a verdadeira identidade de Sauron. O movimento sindical orc poderia trazer elementos diferentes dos explorados por Tolkien para a série, mas foram sepultados quando Galadriel vomita um discurso racista ao confrontar Adar. Não foram as cinzas do vulcão, mas incapacidade da série em explorar ou desenvolver os problemas (que existem na escrita de Tolkien) sobre a representação das diferentes raças (em um mundo em que existem diferentes raças) que sepultou a chance de criar qualquer simpatia por esses personagens.
Elrond e Durin
Essa, apesar do jeito Bill Murray de Gil-Galad, é a parte que melhor funcionou. Ainda que anões não sejam personagens cômicos e a série tenha repetido com Elrond e Durin o humor usado pelo filme com Legolas e Gimli, veremos pela primeira vez a sociedade anã, dentro da montanha que um dia será Moria. Havia até certa tensão, pois todo mundo sabe que os anões cavariam fundo demais (e tensão dissolvida para desnecessária aparição do Balrog, que não faz parte da narrativa neste momento).
Galadriel e Halbrand
É razoável esperar que todos que estão lendo este texto (propositadamente longo, para dar tempo de desistir), sabem que Halbrand é Sauron. Portanto, vamos direto para o principal problema da série: propaganda enganosa. A Amazon tentou vender Sauron como um grande manipulador e Galadriel como a personagem feminina forte da série. Mentiu em ambas.
Galadriel era a escolha certa. Apesar de muito importante, Tolkien não escrevera muito sobre ela. Era citada tanto pela capacidade de liderança e sabedoria, quanto pelo poder (ainda que poder nem sempre seja capacidade militar, ainda que seja sugerido que ela era capaz de feitos físicos acima de destaque). A série decidiu realçar esse lado guerreiro da personagem, o que não é um problema. O problema está no resto.
Há um filme com Mandy Moore, Curtindo a Liberdade, em que ela faz o papel da filha do presidente dos Estados Unidos e, aos 18 anos, foge dos seguranças, se envolve com um jovem, tem várias aventuras e volta para casa transformada da adolescente rebelde em uma adulta. É uma comédia romântica e você encontrará diversos filmes com essa premissa básica. Existe um gênero narrativo deste a antiguidade clássica, mostrando as aventuras de jovens que terminam em amadurecimento. É claro que é um clichê romântico e Galadriel era a pessoa mais velha viva na série. Não uma jovem adolescente. Isso não é purismo, pois essa informação está basicamente na série da Amazon: ela está em Valinor no primeiro capítulo e na imagem antiga que Elendil mostra, por exemplo.
Essa é também a mesma premissa, por exemplo, do filme da Mulher-Maravilha, a diferença é que ao invés de Steve Trevor, ela está com Sauron. A intenção de “chipar” o casal é clara. A propaganda enganosa não está nela ser apenas mais uma princesa guerreira. Está no fato que ela, apesar da certeza da sua “missão”, aceita que Gil-Galad a mande para Valinor, que Elrond assuma a sua “missão” e a todos os conselhos de Halbrand. O pior acontece na cena final dos dois.
Agora precisamos buscar a Galadriel do filme (ou do livro). Frodo oferece o Um Anel e ela resiste à tentação, dizendo ter passado em um teste e poder acabar com o autoexílio e voltar para Valinor. Na série, ela é tentada pelo próprio Sauron. É claro que é um teste mais difícil resistir ao Sauron do que resistir à uma parcela do poder dele contida no Um Anel. Ela já passou no teste. Mas será? A série coloca nas bocas de Sauron as palavras que Galadriel usaria para recusar a oferta de Frodo. Agora, quando ela expressa a sua autonomia e vontade, ela estará usando palavras de quem tentava escravizá-la. Já seria ruim para um personagem de qualquer gênero ter sua voz usurpada por um roteirista preocupado em satisfazer fanboys, mas essa é a personagem promovida como a personagem feminina de destaque da série.
Assim, parece pouco o fato de Sauron ser vendido como um grande manipulador também ser uma mentira. Afinal, ele é um Forest Gump. Por acaso, está nos destroços no mesmo dia que por acaso Galadriel pula no oceano. Por acaso, está usando um símbolo heráldico de uma linhagem real humana que não tem nenhum valor para ele (é tão antiga que apenas Galadriel reconhece e, contraditoriamente, Galadriel descobre que foi extinta em um velho manuscrito). Por acaso, sobrevive à erupção do vulcão e por acaso é levado até um Celembribor preocupado com o apagão élfico. É apenas neste momento que ele tem um plano. Tudo que ele fez antes, foi sem qualquer objetivo. E a primeira coisa que ele tenta fazer com um objetivo é manipular Galadriel e falha. No fim, Sauron não manipulou ninguém e nem teve sucesso com seus planos, porque estava preso ao papel de “crush”.
E sim, tudo isso acontece no último episódio. Falou-se muito sobre a série ser lenta, mas discordo. O ritmo foi frenético. O problema foi a falta de coesão entre as partes e a maioria das coisas que aconteciam não tinham grande importância para a história a ser contada. Quando chegaram no último episódio, foram obrigados a despejar uma série de acontecimentos, sem muita preparação, e pronto. Estavam ali os anéis.
Não é preciso ser fiel ao material original (fidelidade, por si, é vazia), mas é preciso saber para que serve o seu material. Uma construção mitológica precisa de uma base histórica e geográfica para ter força. Galadriel poderia prover (Peter Jackson a usou como narradora por isso) tal força. Não tratar um oceano como uma banheira ou fazer viagens instantâneas entre reinos que são “isolados” em um dia, ajudam para isso. Saber que uma comédia romântica adolescente não pode ser usada para contar uma trama de intriga seria útil também.
Respeitar o talento humano ajuda, mas aí não seria Amazon.
Nos dias 19 e 20 de novembro, o Expominas (Avenida Amazonas, 6200 – Gameleira) será palco de duas apresentações épicas do cine-concerto The Lord of The Rings In Concert: The Fellowship of The Ring – O Senhor dos Anéis In Concert: A Sociedade do Anel. O espetáculo poderá ser visto no sábado, dia 19, às 19h30, e no domingo, dia 20, às 18h00. E os ingressos podem ser adquiridos exclusivamente no site ou app da Fever, a partir de R$150 por pessoa.
Nas apresentações, sob a regência do Maestro Adriano Machado, 250 músicos da Orquestra Sinfônica Villa Lobos interpretarão ao vivo a trilha sonora, ganhadora do Oscar, do compositor Howard Shore, enquanto o filme “O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel”, dirigido por Peter Jackson será exibido em uma tela gigante de alta definição.
A trilha sonora do filme deu ao compositor canadense Howard Shore três Oscars, três Globos de Ouro e quatro Grammys.
Confira a crítica do nosso colunista convidado João Camilo Torres sobre o novo filme baseado em quadrinhos da DC
Não faz muito tempo que Alan Moore, o escritor mais importante de quadrinhos que ostenta uma barba de Mago Merlim, voltou a atacar as adaptações de super-heróis para o cinema. A primeira vez, ele correlacionou o sucesso e o excesso de filmes de super-heróis com a escalada da extrema-direita.
Não, ele não quer culpar o filme da Turma da Mônica com a fascinação brasileira por um Troll que saiu debaixo da ponte, e sim, indicar que a simplificação desses filmes, herdada dos quadrinhos e produzida para o público infantil, provocava na sociedade incapacidade de reflexão e acomodação, o que foi aproveitado por políticos de extrema para chegar ao poder.
Alguns fãs se sentiram surpresos e até mesmo traídos, mas como pensar assim se a importância de Alan Moore está exatamente nessa crítica ao gênero? É importante existir contracultura e o império Disney é o oposto disso. Moore não odeia quadrinhos, literatura infantil ou mesmo heróis. Ele não admite é o uso banal da nostalgia como mecanismo da indústria cultural para acomodar a população. O que ele sugere é que toda obra tem sua importância, alcance e objetivo e deve provocar questionamentos. E o que tem isso a ver com Adão Negro, novo filme do Universo DC, estrelado por Dwayne “The Rock” Johnson?
Adão Negro é um personagem da galeria de vilões do Capitão Marvel, a.k.a. Shazam. Os quadrinhos do Shazam sempre assumiram sua predileção pelo o público infantil, apresentando narrativas fantasiosas, quase absurdas, que incluíam vilões mais caricatos e tigres falantes.
O filme Shazam é o maior acerto do “universo” DC exatamente por encarnar esse espírito, mas o filme Adão Negro, por ter um lado escuro, procura agarrar temas mais sérios e realistas. Se ainda apresenta a figura de um adolescente fazendo o elo entre o fã de super-heróis e o personagem Black Adam, exatamente como foi feito em Shazam, sua trama é uma tentativa de alegorizar sobre a intervenção americana em países do Oriente Médio (ou algo similar e como o Adão Negro é chamado de arma em destruição em massa no filme, poderia estar falando tanto do Nicarágua quanto da Coreia do Norte) e abrir as portas para discutir a idolatria de “salvadores heroicos” (que foi feita no segundo Esquadrão Suicida).
O problema do longa-metragem é menos a falta de profundidade do gênero e mais a falta de estrutura para sustentar a discussão. É tudo simplista e genérico. As situações e os personagens (que incluem a Sociedade da Justiça) já foram vistos em todos os filmes e seriados de super-heróis (não estou falando das revistas, que passaram por essa fase há décadas).
O foco no Adão Negro não traz nada de novo, repetindo-se inclusive a tentativa de usar o humor como forma de expressão, como é feito no MCU. Desta forma, o filme apenas parece mais uma história com mais um vilão final CGI da DC. O filme Shazam realmente escapou da fórmula, mas isso passou batido. Em Adão Negro, gritar Shazam é apenas mais uma das coisas que aconteceu antes.
Falta reflexão. Depois das três temporadas de The Boys, a violência nas cenas de combate, apenas para dizer que o filme é sério e maduro, é tão desnecessária quanto as cenas em câmera lenta. Quando descobriram, com o Mercúrio nos filmes de X-Men, que era possível usar a câmera lenta para representar a velocidade super-humana, parecia que a mania snyderiana seria enterrada de vez. Mas Adão Negro não distingue quando o recurso está sendo usado para mostra um poder dos personagens ou quando é apenas uma (má) opção estilística, que parecem encher a tela de !!!!!!, ao invés de deixar a narrativa fluir naturalmente.
Tirando isso, ninguém deve sair chateado do cinema. Entretanto, ninguém vai sair entretido com a ideia de que o imperialismo americano é ruim se ela é oriunda de um típico produto do império cultural americano.
Assim, você entende porque as eleições são como são.
A série do Sandman conseguiu redimir uma produção fraca e uma péssima adaptação de American Gods, agora sim, com uma narrativa fiel ao estilo de Neil Gaiman. A primeira coisa que me chamou a atenção foram os nomes dos episódios, que seguem cada uma das revistas. Isso já me animou muito, e foi imediatamente respondida pela fidelidade ao traduzir os quadrinhos para uma trama na tela.
A arte das revistas não é o ponto alto pra mim, mas a riqueza de detalhes míticos, místicos e religiosos de Sandman e o sentimento fantástico foi perfeitamente explorado na série de TV, com as tecnologias gráficas atuais.
As escolhas dos atores é maravilhosa, e o arco da Casa das Bonecas que não é meu favorito nas revistas – mas ainda muito bom! – se tornou incrível na série. Gostava da série de Lúcifer, mas não era Neil Gaiman. Amei God Omens. Mas a melhor série, a melhor adaptação, mais fiel, que já assisti em minha vida, fazendo algo excelente se tornar ainda melhor, é Sandman.
Como muitos dizem: O sonho de adaptar Sandman realmente se tornou realidade.
Esta célebre frase significa a continuidade da soberania, e foi isso que vimos hoje nessa transmissão ao vivo pelas mídias sociais da Wizards of the Coast (detentora dos direitos de Dungeons and Dragons).
Dungeons and Dragons hoje é o RPG mais jogado em todo mundo, isso já é ponto pacífico, mas o que vimos hoje foi algo que raramente vemos num líder de mercado. Anúncios que vão diretamente atender aos pedidos dos consumidores. Parece contraditório, não é?
Pois bem, geralmente o que vemos no mercado é uma marca tender a inércia, o famoso “em time que está ganhando não se mexe”, e evitar novos gastos, investimentos, e por aí vai. Hoje, porém, vimos um aceno da empresa líder de mercado no ramo de RPG, em qualquer critério que se queira utilizar (número de vendas, valor de vendas, número de jogadores, etc), na direção de mudar processos e políticas para atender aos seus consumidores. Meu corrompido e carcomido coração negro chega a levemente pulsar com esse afago.
“Mas quais são essas mudanças? O que podemos esperar?”. Você já deve estar aí louco perguntando (afinal o link do vídeo tem 1 hora de duração).
Vamos ao que importa então!
Nova geração, ou melhor interação do sistema de jogo. O One D&D será uma “evolução” da atual 5ª edição, totalmente compatível com ela, mas ao mesmo tempo expandindo as regras e opções. Muitos já têm apelidado carinhosamente de 5.5. Haverá uma revisão dos livros básicos (Livro do Jogador, Livro do Mestre e Manual dos Monstros) a ser lançada em 2024, mas todas as aventuras e suplementos continuarão compatíveis e poderão ser jogadas neste novo conjunto de regras.
As regras serão anunciadas com muita antecedência e testadas por qualquer um que tiver interesse. Formulários de avaliações serão coletados para ajustar ainda mais as propostas aos desejos da comunidade e atender diretamente aos nossos anseios. Aqui está a nossa chance de participar na concepção do que será nosso hobby nos próximos anos.
No momento que escrevo este texto, já está disponível a primeira parte de sugestões, chamada de Unearthed Arcana e a parte das regras relacionadas às novas origens para sua leitura e avaliação. Acesse o material nesse link.
Mas regras acabam sendo apenas um dos pilares desta reformulação. Junto com isso, temos grandes novidades na área digital. No que consta a presença digital e o comércio de livros, a empresa ouviu o clamor das massas, o desejo mais íntimo de qualquer um que já, em algum momento, comprou um livro de RPG em papel e resolveu jogar online. Os livros de Dungeons e Dragons começarão a ser vendidos fisicamente com direito a uma chave de acesso ao conteúdo on-line. Tudo junto, num preço único, pago somente uma vez. Essa notícia por si só já é pra louvar de pé, irmãos e irmãs!
E essa mudança já vai ser testada agora! O próximo livro a ser lançado “Dragonlance: Shadow of the Dragon Queen” já está nesta modalidade. Pode ir ao site do D&D Beyond e ver por você mesmo. Agora você terá seu conteúdo disponível em qualquer lugar para consumo imediato, seja com os livros em mão, ou na tela do celular, laptop, etc.
E por fim, este ano já vimos a aquisição da plataforma digital do D&D Beyond. Essa agora será expandida ainda mais. Quem quiser poderá ter em somente um local tudo o que é necessário para jogar Dungeons and Dragons. Além da atual base de consulta e a melhor ferramenta para a criação de fichas de personagens que existe disponível no mercado, o D&D Beyond está expandindo para ter também uma solução de Virtual Table Top (VTT). Chamado neste momento de Digital Play Experience, ele agora disponibilizará uma ferramenta para você ter digitalmente, em 3D, os mapas de encontros, com direito às miniaturas dos personagens e monstros.
Já ficou feliz? Mas não para por aí! Essa plataforma, além de disponibilizar todas estas melhorias, ainda vai possibilitar que você possa criar seus próprios mapas e personalizar as miniaturas da sua mesa, criando heróis e vilões inesquecíveis! Tudo isso desenvolvido com o lindíssimo motor gráfico da Unreal 5, utilizado em vários jogos da última geração de computadores e consoles.
Isso tudo e nem falei ainda de novidades como os livros que serão lançados em 2023.
Keys from the Golden Vault
Este livro é uma antologia de aventuras curtas de Dungeons & Dragons que serão todas centradas em torno de assaltos. Seguindo os passos de Journeys Through the Radiant Citadel e Candlekeep Mysteries, essas sequências antológicas permitem que uma série de aventuras sejam criadas com foco em um certo tema, que pode ser inserido em qualquer jogo. “Chaves do Golden Vault” estará disponível no inverno de 2023.
Bigby Presents: Glory of the Giants
Se com “Fizban’s Treasure of Dragons”, todos ficaram especialistas em Dragões, agora é hora dos Gigantes terem seu tempo sob os holofotes. “Bigby Presents: Glory of the Giants” será um recurso único para que você possa criar todos os tipos de experiências temáticas com gigantes para seus jogadores no mundo de Dungeons & Dragons. “Bigby Presents: Glory of the Giants” estará disponível na Primavera de 2023.
The Book of Many Things
Este livro de recursos está completamente ligado ao Deck of Many Things. Este compêndio é uma coleção de todas as diferentes criaturas, locais e outros acontecimentos estranhos que podem acontecer uma vez que você puxa uma carta do Deck of Many Things. “The Book of Many Things” estará disponível no verão de 2023.
Phandelver Campaign
Para aqueles que entraram em D&D em algum momento na última década, as chances são de que você já ouviu falar das Minas Perdidas de Phandelver, uma campanha para iniciantes que foi lançada com o Starter Kit. Em 2023, veremos o lançamento de uma expansão para a campanha-base, em que a história gira para incluir algum horror cósmico. Phandelver Campaign será lançada no verão de 2023.
Planescape
Isso mesmo, após “Spelljammer: Adventures in Space” faz sentido que o próximo resgate de um cenário anterior seja o retorno de Planescape. Embora pouco tenha sido revelado sobre o assunto, sabemos que Planescape receberá o mesmo tratamento que Spelljammer com um Guia de Cenário, um Bestiário e uma Aventura em um único pacote. Planescape será lançado no outono de 2023.
Em comemoração ao aniversário de 35 anos do lançamento dos livros da série de Drizzt Du’Orden, novas edições com capas comemorativas serão lançadas. Somando a isso, no livro “Legend of Drizzt Visual Dictionary” serão detalhadas, a fundo, todas as criaturas, locais, personagens da série. Por fim, ainda teremos uma webcomic com direito a passagem de bastão e aventuras em HQ, estrelando a filha de Drizzt e Cattie-Brie tentando se provar como aventureira.
O novo livro de Dragonlance com cenário e uma aventura! Já estou pensando em três personagens novos para jogar. Para quem tiver interesse, será lançado junto o jogo de tabuleiro lindíssimo “Dragonlance: Warriors of Krynn” que pode ser jogado, totalmente separado, por pessoas que não estejam muito envolvidas no hobby específico de RPG.
Mas, todos esses conteúdos ainda veremos com mais detalhes em posts futuros aqui neste Bar. Então, fique atento aos nossos textos e venha com a gente nessa conversa de boteco gostosa sobre RPG.
Até breve! E fecha a conta por hoje, garçom, porque tenho que rever esses vídeos de novo, depois de tomar meu remédio para o coração….
AHHHH, e não podia deixar de falar uma coisa D&D JAPÃO!!!!
Nosso colaborador convidado João Camilo fala sobre Sandman, de Neil Gaiman
A adaptação para as telinhas da Netflix de Sandman chega agora em agosto. Como a maioria das adaptações dos personagens Marvel e DC, existe uma grande expectativa gerada pela base de fãs fermentada por anos de especulações.
Em geral, esse tipo de combustível é perigoso (e já gerou uma série de reações quanto ao elenco), mas Sandman é diferente de todas outras adaptações das duas editoras, ou da maioria delas. O que está sendo adaptado não é um personagem, mas a criação narrativa de um autor. Semelhante a isso, apenas material limitado como Watchmen. Que sabemos, não funcionou bem. E a qualidade do material original é bem superior ao que normalmente é adaptado, especialmente do ponto de vista literário. Estamos ou não falando de Watchmen? Não, é o Sandman de Neil Gaiman mesmo.
Para entender, é preciso voltar aos anos 80, quando Sandman aconteceu. A DC estava renovando vários personagens, sem bem saber com utilizá-los, e Gaiman havia acabado de estrear bem com “Orquídea Negra”. Não era o suficiente para entregar para ele um personagem principal, mas sim para oferecer um secundário. Sandman era um desses heróis que nunca, não importa quantas versões fossem criadas, emplacava. O visual não era interessante o suficiente e o tipo de histórias que o personagem participava nos anos 40s não era de interesse do público que a DC alimentava.
Gaiman percebeu a chance de fazer algo diferente. Toparam. Por um milagre, deram controle ao autor e até hoje, apenas Gaiman escreve as histórias do personagem. Existem produtos derivados, mas é uma surpresa que não tenham feito o desserviço que foi feito com Alan Moore.
A história começa fazendo referência às influências literárias de Gaiman, trazendo temas e imagens da literatura fantástica britânica do final do século XIX e começo do XX. Parte do sentimento decadentista e a melancolia do Twilight Celtic de Yeats é marcante na obra. Sonhos estão se esfacelando. A crença no progresso levou ao desacreditar e à desilusão. É uma série outonal.
A principal referência dos primeiros capítulos vem dos quadrinhos: é Alan Moore. Responsável por abrir caminho para autores ingleses no mercado editorial americano, Moore funciona como um fóssil vivo desta mesma tradição literária. Com o Monstro do Pântano, Moore iniciara a mudança que possibilitaria a fé em Sandman pela DC.
De início, a história dos dois personagens periféricos é a mesma: ambos estão inertes, precisam recuperar quem são (no caso do Monstro do Pântano, ele precisa recordar, que é uma forma de sonhar acordado). Gaiman reintroduz personagens que Moore usou: Caim, Abel e Etrigan, por exemplo, e principalmente, começa a viagem de Sandman com John Constantine, que foi o guia do Monstro.
A estrutura de Sandman permite que Gaiman use o que tem de melhor: sua voz de contador de histórias. As tramas interligadas de Sandman são uma moldura, que serve para apresentar várias histórias, seja na forma de contos em uma edição mensal ou dos arcos narrativos, como quando em uma delas, “A casa de bonecas”, o personagem Fiddler’s Dream conta uma versão da Chapeuzinho Vermelho para Rose Walker. É uma estrutura típica das adaptações literárias (em seu significado original, ou seja, escritas) das tradições narrativas orais. Não é por acaso que a obra arquetípica da oralidade levada à escrita, “As 1001 Noites”, esteja presente naquela que é, por muitos, considerada a melhor história publicada em um número de Sandman (Ramadan, nº50).
As referências literárias continuam enriquecendo a paisagem da obra. São piscadelas (como diria Umberto Eco) e não meros easter-eggs, pois fazem sentido dentro da construção narrativa da obra. Por exemplo, Fiddler’s é modelado em G.K.Chesterton, parte daquela influência literária britânica de Gaiman. Chesterton era defensor da imaginação e atacava o racionalismo típico da sociedade da época. Tanto que uma das suas citações mais famosas, é costumeiramente repetida na Internet como sendo de Gaiman, mas quem falou que contos de fadas são importantes não por afirmarem que existem dragões, mas por nos ensinar como derrotá-los foi Chesterton, não Gaiman.
Voltando aos arquétipos, este é outro elemento que Gaiman utiliza para a construção da narrativa. Os personagens principais são arquétipos. Por isso, é um ridículo ainda maior qualquer polêmica quanto aos atores escalados para a série. Se todos os personagens são representações simbólicas de elementos universais, isso significa que funcionam como alegorias, ou seja, símbolos específicos (ou qualquer ator) pode representá-las.
Sendo arquetípicos, os personagens passeiam mais facilmente por diferente cenários e histórias. Como as histórias orais que ignoram fronteiras e tomam novas roupagens para continuarem a existir por milhares de anos. Gaiman também usa as histórias para defender uma de suas principais bandeiras: a defesa da imaginação (que no mundo real é feita quando ele defende bibliotecas).
Sonhos – Gaiman é leitor do escritor argentino Jorge Luis Borges – são nada mais de uma das primeiras formas narrativas. Escrever é um sonho guiado. Sonhar é a imaginação explorando o seu potencial. Assim como o potencial gerado pela leitura, simbolizado pela Biblioteca do Sonho de Lucien, que tem livros imaginados. Sandman é, sem dúvida, a obra mais borgiana dos quadrinhos. E sonhos estão sendo perdidos em um mundo que reprime a imaginação, valoriza o banal e mundano e destrói as relações humanas.
Relações humanas, sim. Pois os Perpétuos (Sandman e sua família) podem ser sentimentos arquetípicos, ou suas representações, da humanidade (ou da vida), mas são apenas humanos. Todas suas histórias são sobre quão incompletos eles são sem a sua “mania”, que classificam como função. Toda a trama foca em como Sandman tem de se libertar de sua obsessão pelas suas obrigações profissionais e sentir-se realizado.
Mas, suas irmãs e irmãos sofrem igualmente. (Não vemos Destino sofrer, mas aposto que ele passa essas páginas do livro bem depressa). Não é apenas Desejo que tenta constantemente preencher o vazio que seus desejos (lacaniamente falando) deixam. São todos eles:um irmão abandona o posto e as coisas continuam sendo destruídas no universo. Talvez não a Morte. Ela entende toda a vida. Ela é plena. Porque uma vez a cada 100 anos, ela é lembrada deste vazio, desse desejo que ela tem pela vida e passa por uma ressignificação. Aquela história, contada na minissérie, é a terapia da personagem.
As aventuras de Gaiman pelo audiovisual têm resultados variados. Alguns bons, outros ruins. Poucos vão ter o peso de Sandman, que acredito ser o seu melhor e mais difícil material. Não é sobre ser fiel (satisfazer os fãs e a mania por um naturalismo imposto à fantasia, ou seja, não entenderam Sandman), ou descobrir como a série vai lidar com os outros personagens da DC (o que importa esses Universos). É ver a voz de contador de histórias presente na tela e entender que Sandman é uma história trágica.